Resenha: Caïna – Setter of Unseen Snares (2015)

Transcender as fronteiras, trazer opostos musicais, e transportar o ouvinte para um admirável mundo novo, é isso que o black metal deve ser. Álbuns que conseguem ser sublimes e aterrorizantes são de uma raridade incrível; e esses fatores combinados me encantam profundamente no black metal, e também é o que leva o gênero a ser uma grande ferramenta de vanguarda.

Há uma qualidade cinematográfica em “Setter de Unseen Snares”; orquestral na forma de arranjos variados e texturas sonoras que fluem como um vento calmo um pouco antes de uma tempestade. Em seguida, as seções mais rápidas criam um toque minimalista de notas e gritos que permanecem como os únicos remanescentes do velho Caïna.

“Setter of Unseen Snares” é simultaneamente ambicioso e amplo, conceitualmente e estilisticamente, por narrar o conto da última família na terra e as suas tentativas de escapar da força apocalíptica de um asteróide que se aproxima. “Eu acho que a consciência humana é um trágico passo em falso na evolução”, diz um trecho presente em “Introduction” – e dito originalmente pelo investigador Rust Cohle, no primeiro episódio da série de tv americana True Detective. Os poços de desolação que este registro é capaz de esculpir no coração do ouvinte são inigualáveis.

É necessário ressaltar o ótimo trabalho do inglês Andrew Curtis-Brignell, que carrega o projeto como membro único a 11 anos, entre lançamentos de EPs, splits e demos. Embora seja um estudante de teologia satanista e tenha as suas raízes na cacafonia da cena norueguesa noventista, Andrew não segue fielmente apenas esses elementos. Há várias influências de punk, post-rock e shoegaze presentes, mas o que de maneira alguma torna o som menos rústico e sujo.

“I Am the Flail of the Lord” é uma música muito acentuadamente punk, mas com um certo clima dark; onde as guitarras aparecem isoladas e a bateria é cru e seca. Já a faixa-título segue a mesma linha, porém mais intensa e trazendo um turbilhão emocional único. O clima e as texturas criadas em “Vowbound” são até interessantes, mas “Applicant / Supplicant” consegue ser mais intrigante por nos levar a uma viagem imaginária de como o Xasthur soaria se fosse uma banda post-punk, só que adicionando um pouco da psicodelia negra do Nachtmystium.

O ápice do álbum está em “Orphan”, uma melancólica construção de 15 minutos que começa com drones típicos do Godspeed You! Black Emperor e abrange elementos totalmente distintos, – como rock gótico, hardcore e post-black metal – de uma maneira coesa e que cresce a cada incursão. As colaborações vocais de Vice Martyr (Hateful Abandon) na primeira parte da faixa e Lawrence Taylor (Cold Fell) na segunda – este último que passou a ser membro permanente do Caïna – são precisas, trazendo um incrível drama ao ouvinte.

Tracklist:
1. Introduction
2. I Am the Flail of the Lord
3. Setter of Unseen Snares
4. Vowbound
5. Applicant / Supplicant
6. Orphan

Deixe um comentário